PERÍODO PROBATÓRIO PARECER DO SIPE - ALTERAÇÃO Dec. Lei no 139-B/2023

É do entendimento do SIPE que o normativo consagrada pelo Dec. Lei no 139-B/2023 de 29 de dezembro, abrange as relações já constituídas, que subsistem à data da sua entrada em vigor e, em consequência, aplica-se aos docentes que iniciaram o período probatório no primeiro período do ano letivo 2023/2024 cujo período probatório ainda subsiste.

 

Bem como a nova redação do artigo 31o do ECD terá como efeito automático (op legis) a antecipação do termo do período probatório em função da contagem nesse período do tempo de serviço prestado em regime de contrato em funções públicas a termo resolutivo e consequentemente o imediato ingresso desses docentes na carreira docente para todos os efeitos, nomeadamente para efeitos de reposicionamento/progressão no escalão/índice correspondente.

 


 

PERÍODO PROBATÓRIO ALTERAÇÃO - Dec. Lei no 139-B/2023

PARECER DO SIPE

 

O DL no 139-B/2023 de 29 de Dez procedeu, entre o mais, à revisão do regime do período probatório através da alteração dos artigos 31o do Estatuto da Carreira Docente.

 

É do entendimento do SIPE que o normativo consagrada pelo Dec. Lei no 139-B/2023 de 29 de dezembro:

- Abrange as relações já constituídas, que subsistem à data da sua entrada em vigor e, em consequência, aplica-se aos docentes que iniciaram o período probatório no primeiro período do ano letivo 2023/2024 cujo período probatório ainda subsiste.

- Bem como a nova redação do artigo 31o do ECD terá como efeito automático (op legis) a antecipação do termo do período probatório em função da contagem nesse período do tempo de serviço prestado em regime de contrato em funções públicas a termo resolutivo e consequentemente o imediato ingresso desses docentes na carreira docente para todos os efeitos, nomeadamente para efeitos de reposicionamento/progressão no escalão/índice correspondente.

 

Fundamentação:

Estamos então perante uma situação de sucessão de leis no tempo, suscitada pela entrada em vigor do Dec. Lei no 139-B/2023.

 

Ora, os problemas suscitados por alterações legislativas podem ser resolvidos pela própria lei nova, no caso de a mesma conter disposições transitórias ou, através das regras estipuladas no art. 12o do Código Civil, no caso de a nova lei nada estatuir.

 

Como ocorre na maioria dos casos, também na situação aqui em análise o legislador nada especifica quanto à problemática da aplicação da lei no tempo, sendo então necessário lançar mão às regras previstas no referido preceito do CC para determinar qual a redação legal aplicável aos docentes que iniciaram o período probatório no primeiro período do ano letivo 2023/2024.

 

Dispõe o art, 12o do Código Civil:

1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.

2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade, substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.

 

Então vejamos

O no1 do art. 12o, no1 do Código civil consagra o princípio da não retroatividade das leis, isto é, elas só se aplicam aos casos futuros à data da sua entrada em vigor.

 

No entanto nos termos do no 2 deste preceito legal:

a) Se a nova lei se prender com qualquer facto produtor de certo efeito, a mesma só se aplica aos factos novos, isto é, aos que ocorram após a sua entrada em vigor;

b) Se a nova lei disser for atinente só ao direito, sem referência ao facto que lhe deu origem, aplica-se às relações jurídicas já constituídas que subsistam à data da sua entrada em vigor

 

Posto isto e atendendo à alteração legislativa do art. 31o do ECD em análise verifica-se que a mesma nada dispõe quanto ao facto que deu origem às relações jurídico-laborais em causa, nomeadamente: nada regula ou altera quanto aos requisitos de vinculação na carreira ou às condições formais de contratação/recrutamento.

 

De outro modo, a nova lei dispõe diretamente sobre o conteúdo das relações jurídicas em causa – nomeadamente quanto ao respetivo período probatório, passando a considerar no mesmo certo tempo de serviço prestado - por docentes com qualificação profissional para a docência em regime de contrato em funções públicas a termo resolutivo - abstraindo dos factos que deram origem a essas relações laborais.

 

Assim sendo, só se poderá concluir que a lei em causa abrange as relações já constituídas, que subsistem à data da sua entrada em vigor e, em consequência, não poderá deixar de ser aplicada aos docentes que iniciaram o período probatório no primeiro período do ano letivo 2023/2024 cujo período probatório ainda subsiste.

 

Mas uma outra consequência se deverá retirar da nova lei:

Como se viu, a nova redação do artigo 31o do ECD terá como efeito automático (op legis) a antecipação do termo do período probatório em função da contagem nesse período do tempo de serviço prestado em regime de contrato em funções públicas a termo resolutivo. Mas se é assim, essa antecipação deverá ter como consequência o imediato ingresso desses docentes na carreira docente para todos os efeitos nomeadamente para efeitos de progressão no escalão/índice correspondente.

 

A estes argumentos legais acresce o interesse público de política legislativa da necessidade de unidade e homogeneidade do ordenamento, promovendo segurança e igualdade jurídica e garantindo que, para situações jurídicas da mesma natureza, não se aplicam leis diferentes.

 

Diga-se porém que “Estas últimas normas, que regulam apenas o conteúdo das situações jurídicas já constituídas, abstraindo dos factos que as originaram, não são, verdadeiramente, retroativas, porquanto não visam atingir os factos anteriores à sua entrada em vigor, verificando-se uma «retroconexão» ou uma «referência pressuponente», tratando-se antes de uma aplicação imediata, no futuro, às relações constituídas e subsistentes à data da sua entrada em vigor.” como se refere no Ac. Ac. STJ de 13-09-2011 (Relator Hélder Roque, Proc. no 1029/10.6T2AVR.S1)

 

No sentido do nosso entendimento supra exposto:

Ac. do STJ de 8-06-1994 in B.M.J. 438/441
Ac. STJ 13-09-2011, Relator Hélder Roque, Proc. no 1029/10.6T2AVR.S1 e Ac. TRL de 13-10-2004, Relator, Duro Mateus Cardoso, Proc. no 1444/2004-4, do qual se transcrevem alguns excertos pela sua integral pertinência e clareza neste contexto que aqui se analisa

 

“... A propósito do disposto no no 1 do art. 12o do CC escreve o Prof. Antunes Varela na Revista de Legislação e Jurisprudência, 120o- 108, que "Ao escrever, em termos gerais, como princípio básico de toda a matéria, que a «a lei só dispõe para o futuro», o art. 12o do Cód. Civil quer muito prosaicamente afirmar (inspirado num simples critério de bom senso) que os particulares não podem ser profetas ou adivinhos do futuro e que não podem, consequentemente, ser penalizados por não terem previsto o direito futuro ou por não terem agido em conformidade com ele. Por isso, cada acto tem como direito aplicável a lei vigente à data da sua prática (tempus regit actum)".

 

“No entanto, como se escreve no Ac. do STJ de 9/12/92, disponível em www.dgsi.pt/jstj, "...o princípio de que a lei rege apenas para o futuro tem um alcance diferente conforme se trate de uma, lei que dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos - situação em que se entende, em caso de dúvida, que só visa os factos novos, não podendo aplicar-se a lei nova a situações anteriores - ou de uma lei que dispõe directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem (cfr. n. 2, do citado artigo 12). A aplicação ou não aplicação imediata das disposições da lei nova às relações de trabalho anteriormente constituídas que subsistam na data do início da sua vigência, depende, pois fundamentalmente da qualificação dessas disposições, ou seja, da resposta à questão de saber se elas abstraem ou não dos factos constitutivos das situações jurídicas visadas nas suas hipóteses legais. Essas disposições podem referir-se ao contrato de trabalho e não possuírem a natureza de regras próprias de um estatuto contratual, bastando que não encarem as partes, ou uma das partes, enquanto contratantes, mas enquanto membros de uma determinada classe ou como pessoas que se encontram cru dada situação (v. g., como trabalhador e não como contratante, isto é, como simples contraparte num contrato de trabalho).

 

Assim, a disposição legislativa abstrairá dos factos constitutivos os da situação jurídica contratual quando for dirigida à tutela dos interesses de uma generalidade de pessoas que se encontram ou possam vir a estar ligadas por uma certa relação jurídica, como, por exemplo, por uma relação jurídica de trabalho forma a poder afirmar-se que tal disposição atinge essas pessoas, não na qualidade de contratantes, mas como pessoas ligadas por determinado tipo de vínculo contratual (enquanto empregadores e trabalhadores." ligadas por determinado tipo de vínculo contratual (enquanto empregadores e trabalhadores."

 

Bernardo da Gama Lobo Xavier, Curso de Direito do Trabalho, ed. de 1992, Verbo, a pag. 267, escreve também que "o princípio dominante na matéria de aplicação das normas laborais no tempo é o da imediata sujeição às novas normas mesmo dos contratos de trabalho celebrados à sombra das normas anteriores".

 

E a págs. Página 6 de 9268 e 269 acrescenta ainda que não existe quebra da confiança na estabilidade de uma regulamentação de carácter supletivo, à data da celebração do contrato, uma vez que o contrato de trabalho é "...regido por normas imperativas (isto é, não supletivas) e em cuja possível regulamentação os contraentes têm diminuta capacidade de intervenção («estatuto legal»)".

 

A questão, não sendo de estatuto contratual, "...é pois de estatuto legal, no caso do contrato de trabalho...

 

Como se dissemos, a regra da não aplicação das normas aos contratos anteriores refere- se apenas às disposições relativas ao estatuto contratual. Ora caso há em que a norma é pertinente a um estatuto legal, de modo a poder dizer-se que tal disposição se dirige às pessoas, não enquanto contraentes, mas enquanto indivíduos ligados por certo tipo de vínculo contratual (enquanto patrões e trabalhadores, senhorios ou inquilinos, etc.). Situações deste tipo ocorrem tipicamente no contrato de trabalho, de modo a poder dizer-se que a lei visa regular o estatuto laboral e não propriamente o clausulado contratual; - portanto a nova lei é de aplicação imediata ao conteúdo e efeitos dos contratos já existentes.

 

Nestes casos, a lei abstrai dos factos que deram origem ao contrato (art. 12o do C. Civ.), isto é, do consenso das partes.

 

'Por outro lado, no Direito do Trabalho, a imediata aplicação da lei aos contratos vigentes destina-se a promover a igualdade dos trabalhadores quanto às condições de trabalho (não sendo admissível torná-las variáveis com a data dos respectivos contratos) e dirige-se também a responder, com actualidade, às exigências sociais em contínua mutação.

 

'Ora, contraria a lógica da dinâmica social, em que as novas condições são obtidas normalmente através de processos reivindicativos, que as novas normas se aplicassem apenas aos futuros contratos. A reivindicação destina-se a alterar as regras existentes e a causar um benefício imediato aos trabalhadores actuais: seria um contra-senso que as novas regras beneficiassem apenas os futuros trabalhadores, que por elas se não bateram, em detrimento daqueles que tinham actuado os processos conducentes à modificação do sistema".

 

Deste modo, tendo-se em consideração que no direito do trabalho a autonomia da vontade quanto à fixação do conteúdo dos contratos de trabalho sofre vastas limitações, pode-se considerar existir uma regulamentação de estatuto dos trabalhadores vistos como pessoas integrantes de uma categoria social, pelo que as leis sobre o contrato de trabalho devem ser de aplicação imediata ao conteúdo e efeitos futuros dos contratos de trabalho anteriores.

 

Neste sentido, veja-se ainda Baptista Machado,

"Sobre a aplicação no Tempo do novo Código Civil, 1968", pags. 104 e 122 a 124; também João Baptista Machado, Lições de Direito Internacional Privado, 2a ed., Almedina, pags. 317 a 335 ...

 

Outros autores, porém, embora trilhando diferente caminho interpretativo do art. 12o do CC, acabariam por chegar à mesma conclusão de aplicabilidade imediata da Lei no 18/2001 ao caso dos autos, uma vez que o contrato de trabalho integra em si inequívoca natureza de relação jurídica de carácter duradouro.

 

Assim, sustenta o Prof. Inocêncio Galvão Telles, Direito das Sucessões, Noções Fundamentais, 4o ed., Coimbra Editora, a pag. 267 que,

"...no tocante aos efeitos jurídicos de um facto pretérito ainda não esgotados quando surge a lei nova, cumpre distinguir os que se traduzem em situações instantâneas e os que se traduzem em situações duradouras. As primeiras tendem a desaparecer, as segundas a perdurar; aquelas resolvem-se em acto ou actos isolados, estas em actos periódicos ou permanentes; a execução de umas é momentânea, a das outras é sucessiva ou continuada. Representam por ex. situações instantâneas o direito à restituição do capital mutuado ou o direito à anulação de um acto jurídico; situações duradouras, a posição de funcionário público, a de senhorio e de inquilino, a de proprietário, a de cônjuge. A lei antiga rege os factos e os efeitos pretéritos, considerando-se como pretéritos os já executados. Quanto aos outros efeitos, ainda não executados ou nem sequer nascidos, há que ver se integram situações instantâneas ou duradouras.

... A lei não vai regular as situações na sua fase transata, mas submete-as a si na sua projeção futura.".

 

Em entendimento similar ao do Prof. Galvão Telles pode ver-se o Prof. Antunes Varela, na Revista de Legislação e Jurisprudência, 120o- 151, onde realça as duas faces do princípio da aplicação prospectiva da lei, sendo a primeira a relativa aos simples factos, relativamente aos quais, na falta de disposição em contrário, só se aplica aos factos futuros, entendidos como aqueles que só ocorrem após a entrada em vigor da nova norma; A segunda face, a relativa às relações jurídicas que emanam daqueles factos, em especial as relações jurídicas duradouras, aplicando-se então a lei nova às relações jurídicas constituídas na sua vigência, mas também às constituídas anteriormente que mantenham a sua vida jurídica para além da entrada em vigor da nova lei.”

 

Em face do exposto, dúvidas não subsistirão, razoavelmente, em como o normativo consagrada pelo Dec. Lei no 139-B/2023 de 29 de dezembro:

1) - Abrange as relações já constituídas, que subsistem à data da sua entrada em vigor e, em consequência, não poderá deixar de ser aplicada aos docentes que iniciaram o período probatório no primeiro período do ano letivo 2023/2024 cujo período probatório ainda subsiste.

2) - Bem como a nova redação do artigo 31o do ECD terá como efeito automático (op legis) a antecipação do termo do período probatório em função da contagem nesse período do tempo de serviço prestado em regime de contrato em funções públicas a termo resolutivo e consequentemente o imediato ingresso desses docentes na carreira docente para todos os efeitos, nomeadamente para efeitos de reposicionamento/progressão no escalão/índice correspondente.

 

Não podemos parar.

Todos Unidos Conseguimos.