A política anda pouco educativa

A política anda pouco educativa

Por: Professora Marlene Afonso

Professora e Investigadora

 

 

Embrenhamos no campeonato partidário, o holofote paira nos duelos entre candidatos que personificam ideologias, cores, sombras e seja mais lá o que quisermos. Eles são tudo e, não o sendo, nestas ocasiões tornam-se tudo. A Democracia permite (ou ainda vai permitindo) que em cerca de mais do que poucos vinte minutos sejam debatidos em modo canhão, bazuca e, por vezes, com efeito ricochete aquilo que é e será o nosso trabalho, a nossa vida tornando-a numa autêntica, verdadeira e incontornável geringonça. A Democracia vai também permitindo a ditadura do tempo, dos números, das percentagens, das estatísticas.

 

Ali algures onde paira a discussão apresentada em forma de contra-ataque sobre assuntos de incontornável relevância à governação, aparece um tema denominado Educação ao qual até se dá destaque pois afigura-se de conveniente encaixe nos programas eleitorais e que convém mencionar ainda que sob pena de ataque por sua omissão. Ora é sobre esta última que recai a minha atenção. A Educação! Aliás, a minha e a de milhares de “combatentes ainda crentes” como eu que fez e faz dela o trabalho de uma vida e a vê resumida a minutos de opinião. E isto quando é abordada e não esquecida. Convenientemente esquecida, convenhamos. Haverá maior miséria do que a de um “Governo sem Educação”, sem tempo para enfatizar a função e o caráter global e integralmente formativo desta levando-nos aos dias em que até ouvimos falar na desajuizada hipótese de privatização do setor ou mesmo a venda de escolas a professores. Submersos na alegoria (da falsa) política educativa da autonomia das escolas e expectantes no que virá da concretização da já datada regionalização ou descentralização.

 

Pode a Democracia submeter este setor de matéria prima convergente, a Educação, a minutos de antena e vê-la a ser abordada como se de uma receita se tratasse? Pode a Democracia permitir que a Educação seja perspetivada e priorizada de forma tão antagónica conforme a cor política e desprender-se de uma Lei de Bases que ainda vigora? Não deveria a Educação ser estrutura arco-íris transversal a qualquer bloco ou posição ideológica, não obstante?

 

Não andará a política nestes dias pouco educativa?

 

Submissos ao domínio imposto pela ditadura do tempo, dos interesses macropolíticos, assistimos aos agentes sindicais limitados a escassos minutos para debater aquele que sempre foi e será um dos setores basilares de qualquer sociedade. Verifiquemos e julguemos a importância do tempo de antena que dispõe os sindicatos na arena com Ministério da Educação. Começa já por aí! Para quando a decisão de inverter estes tempos? E se fosse concedido o mesmo tempo ao Ministério da Educação para o exercício das suas funções: 5 minutos para expor e debater o que de muito importante se faz nas escolas? Não seria justo? Ou será apenas truque esquiva para não enfrentar escolas 5G com falta de papel higiénico? Deem tempo a quem dedica tempo. Ou será apenas devaneio de quem reflete e prioriza… por mais de cinco minutos?

 

Ainda sobre a ditadura do tempo e dos números: julgávamos ser agora o “momento e ponto rebuçado” para desvendar números relativos à exata contratação de recursos humanos na rubrica relativa à recuperação de aprendizagens (consequência do ensino remoto causado pela pandemia) conforme previsto no Plano 21I23 Escola+ ou serve a “capa” autonomia das escolas para camuflar esta conveniência numérica e/ou outras mais? Por exemplo.

 

Já noutro plano, não foi a Ciência o único meio de resposta a esta crise pandémica à escala mundial? Julgaria o bom senso e a razão que seria suficiente. Quantas lições serão precisas?

 

A obliquidade congruente à interpretação institucional e social tem vindo a empobrecer e defraudar intencionalmente a Educação, a sua organização e estrutura e a Escola Pública, a sua génese, o seu propósito e função máxima que jamais em coerência democrática devem ser postos em causa. Considerado um sacrilégio democrático, a abordagem e interpretação paupérrimas de um setor basilar da sociedade é um ultraje: primeiro ao Estado de coisas para não mencionar um qualquer outro Estado (que ainda está por se definir e assumir) e em segundo a quem assume a sua categoria profissional com a galáctica dedicação a que esta obriga ao seu pleno exercício. Pronuncie-se quem trabalha no perímetro educativo, sem porta-vozes. Porque quem nele trabalha, não adere à cultura da numerologia. Falava-se hoje num conceituado blogue da Educação que os diretores não participam em manifestações. Só dão entrevistas. Talvez outra luz de solução passará por aí: os critérios de seleção de Diretores de escolas. Menos política, mais Educação, se faz favor.

 

A detenção da Educação como refém de jogos de poder é a maior prova de ignorância e ineficácia política à escala nacional e global.

 

No dia em que a política for mais educativa ou a Educação menos política (como quiserem), teremos a Escola que almejamos.

 

Estou em crer que é deveríamos fazer jus à coragem daqueles que outrora saíram à rua, movidos por plenas convicções em prol de um bem comum, de um objetivo maior e dessa força conjunta conquistaram a tão desejada mudança. Quiçá não volta a ser essa a única solução viável e eficaz na resolução desta tentativa de destruição do melhor que conseguimos ter: a escola pública, pelo direito, pela igualdade, pela inclusão.

 

E nesse dia, que ganhe a Educação e que ganhe a Escola Pública!

 

 

Marlene Afonso

Professora e Investigadora